A (renovada) Lei de Improbidade Administrativa e o Programa de Compliance. 8 nov 2021

A (renovada) Lei de Improbidade Administrativa e o Programa de Compliance.

Por Ana Júlia Lima e André Ferraz.[1]

A Lei de Improbidade Administrativa (Lei Federal nº 8.429/1992), vigente há quase 30 anos, sofreu significativas alterações com a publicação, em 26 de outubro de 2021, da Lei Federal nº 14.230/2021, cujo conteúdo previa justamente a atualização da referida norma.

A (renovada) Lei de Improbidade Administrativa segue sendo um relevante instrumento de enfrentamento da corrupção, o qual, agora, possui acertadas previsões – explícitas e implícitas – relacionadas ao programa de compliance.

A primeira novidade relacionada ao programa de compliance está na possibilidade de o Ministério Público celebrar acordo de não persecução civil com os investigados e, para tanto, poderá exigir do infrator a implementação ou o aprimoramento do programa de compliance.

A nova redação da Lei dispõe que o acordo poderá contemplar a adoção de mecanismos e procedimentos internos de compliance, de auditoria e de incentivo à denúncia de irregularidades, bem como a aplicação efetiva de código de ética e conduta no âmbito da pessoa jurídica envolvida[2].

Nesse sentido é que o legislador, acertadamente, trouxe para a nova redação da Lei de Improbidade Administrativa um importante estímulo à adoção do programa de compliance, seja para prevenir a prática dos ilícitos nela descritos, seja para a celebração de acordo de não persecução cível. O  incentivo ao programa de compliance foi precedido pela Lei Anticorrupção (Lei Federal nº 12.846/2013) e posteriormente pela nova Lei de Licitações (Lei Federal nº 14.133/2021).

Outro avanço para o tema de compliance é que a nova redação da Lei de Improbidade Administrativa determina que, para aplicação de eventual sanção, serão avaliadas também as circunstâncias agravantes e atenuantes relacionadas ao caso[3]. A Lei não elenca quais são as agravantes e atenuantes, o que permite ao julgador considerar aspectos próprios da pessoa jurídica infratora – e o principal deles, o compliance.

Nesse sentido, vale lembrar que a Lei Anticorrupção indica, de forma expressa, que a existência de compliance será considerada para redução da sanção, reforçando o argumento de que o programa deve ser analisado em se tratando de ilícitos cometidos contra a Administração Pública.

Outra mudança positiva na Lei de Improbidade Administrativa é a previsão de responsabilidade da pessoa jurídica em caso de fusões e aquisições societárias [4].

A nova previsão limita expressamente a responsabilidade da empresa sucessora à obrigação de reparação integral do dano até o limite do patrimônio transferido, exceto em casos de comprovada simulação ou fraude no processo de fusão ou incorporação. Tal limitação, também presente na Lei Anticorrupção, agora extinguiu uma significativa lacuna que havia até então na Lei de Improbidade Administrativa. Este é um avanço legislativo que pode aprimorar a segurança jurídica de empresas que atuam ou pretendem atuar no Brasil.

Além disso, ao trazer expressamente as “regras do jogo” em operações de M&A, o compliance ganha ainda mais contorno: torna-se crucial avaliar as empresas-alvo de tais operações, a fim de avaliar não somente as estruturas internas de compliance das empresas que serão adquiridas, mas também possíveis riscos de integridade a elas ligados (ex.: envolvimento em processos criminais, cíveis e administrativos que possam expor a empresa sucessora).

É inegável que as alterações na Lei de Improbidade Administrativa são diversas e há muito espaço para o debate. No entanto, podemos desde já reconhecer que a crescente inclusão do compliance nas normas nacionais representa a difusão e o amadurecimento do tema no Brasil.


[1] Ana Júlia Lima é advogada do Campos Mello Advogados, Mestre em Direito pela PUC/SP, autora do livro “Programa de Integridade e Lei Anticorrupção – o Compliance na Lei Anticorrupção Brasileira” e Diretora Adjunta do IDASAN – Instituto de Direito Administrativo Sancionador. André Ferraz é advogado do Campos Mello Advogados, especialista em Compliance.

[2] Redação do artigo 17-B, §6º da Lei de Improbidade Administrativa.

[3] Conforme determina o artigo 17-C, IV, alínea “e”.

[4] Conforme redação do artigo 8º-A.

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