Alerta Bancário: Nova regulamentação cambial do Banco Central
A Lei no.14.286 de 29 de dezembro de 2021 (“Lei 14.286”), o novo marco legal do mercado de câmbio no Brasil, entrou em vigor no último dia 30 de dezembro. Em decorrência disso, o Banco Central do Brasil (“Bacen”) editou uma série de normativos para regulamentar a Lei 14.286.
Foram cinco Resoluções BCBs, todas de 31 de dezembro de 2022. A Resolução BCB nº 277, que regulamenta o mercado de câmbio e ingresso e saída de valores em reais e em moeda estrangeira. A Resolução BCB nº 278, que regulamenta as operações de crédito externo e de investimento estrangeiro direto, bem como a prestação de informações ao Bacen. A Resolução BCB nº 279, que regulamenta o capital brasileiro no exterior. A Resolução BCB nº 280, que estabelece a definição de residente e de não residente a ser aplicada para pessoas físicas e jurídicas no âmbito da Lei nº 14.286. Finalmente, a Resolução BCB nº 281 regulamenta disposições transitórias a serem observadas nas operações de crédito externo e de investimento estrangeiro direto, bem como a prestação de informações ao Bacen.
Esse novo arcabouço legal implementou diversas mudanças no mercado cambial. Dada a natureza desse informativo, vamos abordar aqui apenas aquelas que consideramos mais relevantes.
Mercado de Câmbio
Operação de Câmbio
De uma forma geral, o Bacen agilizou a realização das operações de câmbio. As pessoas físicas e jurídicas em geral passam a indicar a finalidade dessas operações, o que antes era feito pelos bancos e corretoras autorizados a operar no mercado de câmbio. São apenas oito códigos para indicar a finalidade de operações em geral de até US$50.000 (cinquenta mil dólares dos Estados Unidos). Para operações de câmbio de mais de US$50.000 (cinquenta mil dólares dos Estados Unidos) ou que, independentemente do valor, estejam sujeitas à prestação de informações de capitais estrangeiros, há uma lista maior[1].
Finalmente, não há mais um contrato de câmbio padronizado, sendo necessárias apenas as informações mínimas constantes do Anexo I da Resolução BCB nº 277 e a comprovação de consentimento do cliente. Além disso, a instituição autorizada a operar no mercado de câmbio também pode requisitar ou dispensar, conforme sua avaliação, informações e documentos comprobatórios, considerando a avaliação do cliente e as características da operação.
Autorização para Operar no Mercado de Câmbio
Somente instituições autorizadas a operar no mercado de câmbio podem realizar pagamento ao exterior ou recebimento do exterior de moeda estrangeira. Essa autorização pode ser concedida para (i) bancos e a Caixa Econômica Federal; (ii) sociedades corretoras de títulos e valores mobiliários, sociedades distribuidoras de títulos e valores mobiliários, sociedades corretoras de câmbio, sociedades de crédito, financiamento e investimento e agências de fomento[2]; e (iii) instituições de pagamento autorizadas a funcionar pelo Bacen que prestem serviço como emissor de moeda eletrônica, emissor de instrumento de pagamento pós-pago ou credenciador, vedadas a condução de operações com correspondentes e operações envolvendo moedas em espécie, nacional ou estrangeira[3].
A Resolução BCB nº 277 traz os requisitos e procedimentos para a outorga da autorização pelo Bacen.
Serviço de Transferência ou Pagamento Internacional (eFX)
A Resolução BCB nº277 incorporou as normas relacionas com o prestado de serviço de eFX, que permanecem substancialmente inalteradas.
Contas de Não Residente em Reais
Como já estava previsto na Lei 14.826, a Resolução BCB nº 277 simplificou consideravelmente a abertura de contas no Brasil para não residentes. Ela dispôs que as instituições autorizadas a operar no mercado de câmbio podem abrir, manter e encerrar contas de depósito e contas de pagamento em reais tituladas por não residentes nas mesmas condições nas quais podem abrir e manter tais contas tituladas por residentes.
Existem apenas algumas limitações impostas pela regulamentação. Dentre elas, vale destacar que a movimentação de recurso de interesse de terceiro em conta de não residente somente é permitida se a conta for titulada por instituição domiciliada ou com sede no exterior sujeita à regulação e à supervisão financeira em seu país de origem e mantida em banco autorizado a operar no mercado de câmbio (sujeitas a algumas restrições adicionais).
Contas em Moeda Estrangeira no País
Outra mudança bastante aguardada, também prevista na Lei 14.286, foi a regulamentação da abertura de contas de depósito em moeda estrangeira no País abertas, mantidas e encerradas por instituições bancárias autorizadas a operar no mercado de câmbio.
Os recursos mantidos nas contas de depósito em moeda estrangeira podem ser livremente aplicados no mercado internacional, salvo eventual restrição estabelecida em legislação especial ou por órgão regulador.
Neste momento, somente podem ser titular de contas de depósito em moeda estrangeira as seguintes entidades: (i) agência de turismo ou prestador de serviços turísticos, tendo a conta movimentação restrita a recebimentos e pagamentos decorrentes de sua atuação no turismo emissivo ou receptivo; (ii) embaixadas, legações estrangeiras e organismos internacionais reconhecidos pelo Governo brasileiro, tendo a conta livre movimentação; (iii) empresa que atue na prestação de serviços postais, tendo a conta movimentação restrita ao curso das sistemáticas de vale postal internacional, vedada movimentação de valores em espécie; (iv) emissores de cartões de crédito de uso internacional, tendo a conta movimentação restrita à efetivação de pagamentos ao exterior pela utilização em lojas francas e no exterior de cartões emitidos no Brasil, vedada movimentação de valores em espécie; (v) estrangeiro transitoriamente no País e brasileiro não residente, observado que seus créditos são restritos a recursos oriundos do exterior e que os débitos se sujeitam a operação de câmbio no caso de transferência no Brasil para residente; (vi) entidades da administração direta e indireta da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, sendo que a conta deve ser vinculada a operação de crédito externo (contas designadas) concedido por organismos internacionais e agências governamentais estrangeiras e que, no caso de contas da União, devem ser observadas as condições estabelecidas pela Secretaria do Tesouro Nacional; (vii) empresas encarregadas da implementação e desenvolvimento de projetos do setor energético; (viii) sociedades seguradoras, resseguradoras e corretoras de resseguro; (ix) transportadores não residentes; (x) instituições autorizadas a operar no mercado de câmbio; e (xi) empresas detentoras de direitos de exploração e produção de petróleo e gás natural.
Para as entidades listadas nos itens (vii), (viii), (ix) e (xi) acima a Resolução BCB nº 277 estabelece requisitos adicionais para a abertura e movimentação das contas de depósito em moeda estrangeira.
Capital Estrangeiro no Brasil
Entre as mudanças trazidas pela Resolução BCB nº 278, vale a pena destacar a simplificação do registro de capitais estrangeiros no Brasil junto ao Bacen. A prestação de informações de capitais estrangeiros é exigida agora apenas nas seguintes situações:
- crédito externo superior a US$1.000.000,00 (um milhão de dólares dos Estados Unidos da América) ou seu equivalente em outras moedas;
- importação financiada de bens ou serviços superior a US$500.000,00 (quinhentos mil dólares dos Estados Unidos da América) ou seu equivalente em outras moedas, e com prazo de pagamento maior que 180 dias;
- recebimento antecipado de exportação e arrendamento mercantil financeiro externo superior a US$1.000.000,00 (um milhão de dólares dos Estados Unidos da América) ou seu equivalente em outras moedas, e com prazo de pagamento maior que 360 dias;
- investimento estrangeiro direto com movimentação superior a US$100.000,00 (cem mil dólares dos Estados Unidos da América) ou seu equivalente em outras moedas; e
- investimento em portfolio (carteira) de não residente no Brasil.
Os registros (i) dos contratos de royalties, de serviços técnicos e assemelhados, de arrendamento mercantil operacional externo, de aluguel e de afretamento efetuados anteriormente à vigência desta Resolução e (ii) das operações de crédito externo efetuados anteriormente à vigência da Resolução BCB nº 278 e não enquadrados nas hipóteses acima, estão dispensados de serem atualizados, mas devem permanecer disponíveis para consulta pelo período de um ano após a entrada em vigor da Resolução.
O Bacen ainda vai divulgar, em sua página na internet, Manuais do Declarante contendo instruções para a prestação de informações de capital estrangeiro no País.
Finalmente, a Resolução BCB nº 281 regulamenta disposições transitórias, incluindo sobre operações simultâneas de câmbio, e suas disposições devem ser observadas, no que aplicável, até 31 de outubro de 2023.
Capital Brasileiro no Exterior
Seguindo o que já estava disposto na Lei 14.826, a Resolução BCB nº 279 também flexibiliza as operações de câmbio de investimento brasileiro no exterior. O princípio geral é que a aplicação do capital brasileiro no exterior (incluindo em operações de derivativo) pode ser efetuada em qualquer modalidade regularmente praticada no mercado internacional.
As transferências financeiras relacionadas a capital brasileiro no exterior devem ser cursadas em instituição autorizada a operar no mercado de câmbio, observados os limites e as condições específicas estabelecidas na legislação e na regulamentação, salvo nas operações com derivativos, que devem ser cursadas apenas em banco autorizado a operar no mercado de câmbio.
As informações sobre o capital brasileiro no exterior devem ser prestadas ao Bacen mediante declaração anual e trimestral enviadas por meio eletrônico. A declaração anual deve ser enviada quando os capitais brasileiros no exterior, na data-base anual[4], totalizarem quantia igual ou superior a US$1.000.000,00 (um milhão de dólares dos Estados Unidos da América) ou seu equivalente em outras moedas. Já a declaração trimestral deve ser enviada quando os capitais brasileiros no exterior, na data-base trimestral[5], totalizarem quantia igual ou superior a US$100.000.000,00 (cem milhões de dólares dos Estados Unidos da América) ou seu equivalente em outras moedas. Esses limites estão sujeitos a alguns ajustes estabelecidos na resolução.
Definição de Residência
Por fim, a Resolução BCB nº 280 estabelece a definição de residente e de não residente a ser aplicada para pessoas físicas e jurídicas no âmbito da Lei nº 14.286
Considera-se residente a pessoa física: (i) que resida no Brasil em caráter permanente; (ii) que se ausente do País para prestar serviços a partir do exterior para a Administração Pública Federal brasileira; (iii) que se encontre no Brasil com autorização de residência deferida por prazo indeterminado, a partir da data de ingresso no País; (iv) que se encontre no Brasil com visto temporário[6]; (v) brasileira que, na condição de não residente, entrar no País com ânimo definitivo, a partir da data de ingresso no País; (vi) residente que se retire em caráter temporário do território nacional, durante os primeiros 12 (doze) meses consecutivos de ausência, desde que não haja manifestação da pessoa física para a instituição autorizada a operar no mercado de câmbio com justificativa para reduzir ou aumentar esse prazo.
Considera-se não residente a pessoa física: (i) que não se enquadre nas hipóteses previstas acima; (ii) que se retire em caráter permanente do território nacional, a partir da data da saída do País; (iii) que, na condição de não residente, preste serviço a partir do Brasil como funcionária de governo estrangeiro, ressalvado o disposto no item (v) acima; (iv) residente que se ausente do Brasil em caráter temporário, a partir do dia seguinte àquele em que complete 12 (doze) meses consecutivos de ausência, desde que não haja manifestação da pessoa física para a instituição autorizada a operar no mercado de câmbio com justificativa para reduzir ou aumentar esse prazo.
Quanto à pessoa jurídica, considera-se: (i) residente a entidade domiciliada ou com sede no Brasil; (ii) não residente a entidade domiciliada ou com sede no exterior e que não se enquadre na hipótese descrita acima.
[1] As listas de códigos estão disponíveis em https://www.bcb.gov.br/estabilidadefinanceira/operacoes-de-cambio.
[2] Somente para as seguintes operações: (a) operações de câmbio com clientes para liquidação pronta de até US$300.000,00 (trezentos mil dólares dos Estados Unidos) ou o seu equivalente em outras moedas, não sendo permitidas transferências referentes a negociação de instrumentos financeiros derivativos no exterior; e (b) operações para liquidação pronta no mercado interbancário, arbitragens no País e arbitragens com o exterior.
[3] Somente para as seguintes operações: (a) operações de câmbio com clientes para liquidação pronta de até US$100.000,00 (cem mil dólares dos Estados Unidos) ou o seu equivalente em outras moedas, não sendo permitidas transferências referentes a negociação de instrumentos financeiros derivativos no exterior; e (b) operações para liquidação pronta no mercado interbancário, arbitragens no País e arbitragens com o exterior.
[4] A data-base da declaração anual é 31 de dezembro. O período para o envio da declaração anual é de 15 de fevereiro a 5 de abril do ano subsequente à data-base.
[5] As datas-bases das declarações trimestrais são 31 de março, 30 de junho e 30 de setembro. Os períodos para o envio das declarações trimestrais são: (i) de 30 de abril a 5 de junho subsequente, no caso da data-base de 31 de março; (ii) de 31 de julho a 5 de setembro subsequente, no caso da data-base de 30 de junho; e (iii) de 31 de outubro a 5 de dezembro subsequente, no caso da data-base de 30 de setembro.
[6] Nas seguintes condições: (a) trabalhando com vínculo empregatício ou desenvolvendo atividade econômica no País, a partir da data de ingresso no País; ou (b) com permanência há mais de 12 (doze) meses consecutivos no Brasil, desde que não haja manifestação da pessoa física para a instituição autorizada a operar no mercado de câmbio com justificativa para reduzir ou aumentar esse prazo.
PRINCIPAIS CONTATOS:
Roberto Vianna do R. Barros
Sócio
E: rbarros@cmalaw.com
Jorge Gallo
Sócio
E: jorge.gallo@cmalaw.com
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