Alterações relevantes na Legislação sobre Contratos de Propriedade Intelectual 2 fev 2023

Alterações relevantes na Legislação sobre Contratos de Propriedade Intelectual

Alterações relevantes na Legislação sobre Contratos de Propriedade Intelectual – Preços De Transferência, Mercado De Câmbio e INIP

Novas Regras do Banco Central

A Lei n.º 14.286 de 29 de dezembro de 2021 (“Lei 14.826”), o novo marco legal do mercado de câmbio no Brasil, entrou em vigor no último dia 30 de dezembro. Em decorrência disso, o Banco Central do Brasil (“Bacen”) editou uma série de normativos para regulamentar a Lei 14.826.

Foram cinco Resoluções BCBs, todas de 31 de dezembro de 2022. A Resolução BCB n.º 277, que regulamenta o mercado de câmbio. A Resolução BCB n.º 278, que regulamenta as operações de crédito externo e de investimento estrangeiro direto, bem como a prestação de informações ao Bacen. A Resolução BCB n.º 279, que regulamenta o capital brasileiro no exterior. A Resolução BCB n.º 280, que define o residente e o não residente (a ser aplicada para pessoas físicas e jurídicas). Finalmente, a Resolução BCB n.º 281, que regulamenta disposições transitórias a serem observadas nas operações de crédito externo e de investimento estrangeiro direto, bem como a prestação de informações ao Bacen.

Entre as mudanças trazidas pela Resolução BCB n.º 278, vale a pena destacar a simplificação do registro de capitais estrangeiros no Brasil junto ao Bacen. A prestação de informações de capitais estrangeiros é exigida agora apenas nas seguintes situações:

  • crédito externo superior a US$1.000.000,00 (um milhão de dólares dos Estados Unidos da América) ou seu equivalente em outras moedas;
  • importação financiada de bens ou serviços superiores a US$500.000,00 (quinhentos mil dólares dos Estados Unidos da América) ou seu equivalente em outras moedas, com prazo de pagamento maior que 180 dias;
  • recebimento antecipado de exportação e arrendamento mercantil financeiro externo superior a US$1.000.000,00 (um milhão de dólares dos Estados Unidos da América) ou seu equivalente em outras moedas, com prazo de pagamento maior que 360 dias;
  • investimento estrangeiro direto com movimentação superior a US$100.000,00 (cem mil dólares dos Estados Unidos da América) ou seu equivalente em outras moedas; e
  • investimento em portfolio (carteira) de não residente no Brasil.

Os registros dos contratos de royalties, de serviços técnicos e assemelhados, de arrendamento mercantil operacional externo, de aluguel e de afretamento não estão mais sujeitos a registro, e aqueles efetuados anteriormente à vigência desta Resolução estão dispensados de serem atualizados, mas devem permanecer disponíveis para consulta pelo período de um ano após a entrada em vigor da Resolução. Em outras palavras, os registros que já foram feitos seguem valendo e não precisam ser atualizados (mesmo que ocorram mudanças na operação subjacente), e devem permanecer em vigor por pelo menos um ano da data da Resolução. Depois desta data, poderão ser cancelados. Por fim, a regulamentação anterior falava que o registro com o Bacen somente seria feito com a informação do número do certificado de averbação concedido pelo INPI. Obviamente, como o registro no Bacen não é mais necessário, a averbação do INPI também não é mais requerida para a remessa (apesar de que a empresa autorizada a operar no mercado de câmbio pode, eventualmente, pedir tal documentação).

Por fim, a Lei 14.826 expressamente revogou os dispositivos do artigo 14 Lei 4.131/62 e do artigo 50 da Lei 8383 que, em suma, proibiam as remessas para pagamento de royalties pelo uso de patentes de invenção e de marcas entre filial ou subsidiária de empresa estabelecida no Brasil e sua matriz com sede no exterior ou quando a maioria do capital da empresa no Brasil pertencesse aos titulares de recebimento de “royalties” no exterior. Nesse último caso, a remessa era autorizada apenas de acordo com o limite de dedutibilidade, cujo limite foi também revogado pela Lei 14.286.

INPI realiza mudanças para simplificar a averbação e o registro de contratos de tecnologia

No dia 30 de dezembro de 2022, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) publicou a SEI INPI n.º 0747049, que estabelece diversas alterações em entendimentos técnicos e aspectos jurídicos sobre o processo de averbação e registro de contratos de transferência de tecnologia no Brasil.

O documento foi resultado de debates e recomendações sugeridas pela Licensing Executive Society (LES) Brasil, da qual a sócia Paula Mena Barreto é vice-presidente, em conjunto com a International Chamber of Commerce (ICC-Brasil).

Após a análise dos temas em pauta, as decisões finais do INPI para simplificar o sistema de averbação e/ou registro de contratos de tecnologia no Brasil foram os seguintes, em resumo:

  • Admissão de assinaturas digitais sem certificado ICP-Brasil, com dispensa também da necessidade de “e-notarização” e “e-apostila” (porém a exigência de apostilamento/legalização consular permanece no caso de documentos físicos assinados no exterior);
  • Dispensa de rubrica em todas as páginas dos contratos e anexos, petições e formulários eletrônicos (a declaração de veracidade dos documentos e informações será suficiente);
  • Eliminação da obrigatoriedade de duas testemunhas, quando o contrato prevê uma cidade brasileira como local de assinatura;
  • Não será mais exigida a apresentação de estatuto, contrato social, ato constitutivo e última alteração sobre objeto social e representação legal consolidada de pessoa jurídica brasileira;
  • Admissão do licenciamento de tecnologia não-patenteada (“know-how”); e
  • Remoção de obstáculos ao registro de contratos que tenham como objeto pedidos de patentes, desenhos industriais e marcas ainda pendentes, de modo a viabilizar o pagamento de royalties pactuados entre as partes contratantes.

Assim, essas mudanças que simplificam o processo de averbação/registro de contratos de tecnologia no INPI contribuem para o aumento de investimentos e para o desenvolvimento da tecnologia no Brasil.

Novas Regras de Preços de Transferência e Impactos para os Contratos de Propriedade Intelectual

No dia 29 de dezembro de 2022 foi publicada a Medida Provisória (MP) n.º 1.152/2022, introduzindo as novas regras de Preços de Transferência (Transfer Pricing) em linha com as Diretrizes da OCDE.

De acordo com o Governo Federal, um dos principais objetivos das novas regras de Transfer Pricing é aderir ao Princípio Arm’s Length e mitigar os problemas decorrentes da recente alteração da política tributária dos EUA, que restringiu o crédito tributário estrangeiro (FTC), enfrentados pelas empresas norte-americanas que investem no Brasil, bem como evitar perdas de arrecadação tributária. Além disso, as novas regras de Transfer Pricing fazem parte do pacote de exigências para que o Brasil possa se tornar membro da OCDE.

As novas regras passam a vigorar a partir de 01/01/2024. No entanto, as empresas poderão optar pela adoção antecipada a partir de 01/01/2023, se quiserem.

A MP n.º 1.152/2022 precisa ser convertida em lei pelo Congresso Nacional no prazo de até 120 dias, sob pena de perder sua eficácia.

Entre as principais novidades trazidas pela MP n.º 1.152/2022, destacamos:

  • Análise de comparabilidade com base nas funções desempenhadas, ativos utilizados e riscos assumidos;
  • Métodos baseados em lucros, i.e., Margem Líquida da Transação (MLT) e Divisão do Lucro (MDL), além de métodos não especificados;
  • A regra do “método mais apropriado”, com uma preferência geral pelo método do Preço Independente Comparado (PIC);
  • Disposições específicas aplicáveis a operações com: commodities, intangíveis, serviços, contratos de compartilhamento de custos, reestruturações de negócios e operações financeiras (incluindo empréstimos e adiantamentos, garantias financeiras, contratos de seguros e acordos de gestão centralizada de tesouraria).

As novas regras previstas na MP acabam com os atuais limites de dedutibilidade de royalties passivos e a necessidade de averbação dos contratos no INPI para fins de dedutibilidade, visto que a MP expressamente revogou o artigo 74 da Lei n.º 3.470/58, os artigos 12 e 13 da Lei n.º 4.131/62 e o artigo 50 da Lei n.º 8.383/91, dentre outros dispositivos. Assim, os limites de dedutibilidade com base em percentuais pré-definidos, entre 1% e 5%, dependendo do tipo de indústria e tecnologia, conforme Portarias do Ministério da Fazenda, como a Portaria MF n.º 436/58, não serão mais aplicáveis.

A determinação da remuneração de intangíveis, geralmente mediante pagamento de royalty ou license fee (em alguns casos, service fee), tomará com base critérios de comparabilidade previstos na legislação que seguem o Princípio Arm’s Length da OCDE, o qual busca, em transações entre terceiros não-relacionados, comparáveis de mercado para determinação do percentual adequado para fins de dedutibilidade (ou reconhecimento de receita, no caso de royalty ativo).

Cabe ressaltar que, com a revogação das alíneas “d” a “g” do parágrafo único do art. 71 da Lei n.º 4.506/64, encerra-se a dúvida sobre a dedutibilidade de royalties pagos pelas empresas no Brasil para a suas controladoras no exterior, tópico de grande controvérsia entre o Fisco Federal e os contribuintes.

No entanto, a MP determina que os royalties e service fees por assistência técnica, científica, administrativa ou similar são indedutíveis quando pagos (i) a entidades residentes ou domiciliadas em país ou dependência com tributação favorecida ou que sejam beneficiárias de regime fiscal privilegiado, de que tratam os art. 24 e art. 24-A da Lei n.º 9.430, de 1996; ou (ii) a partes relacionadas, quando a dedução dos valores resultar em dupla não tributação, conforme hipóteses definidas na MP.

Cabe destacar que se aguarda a edição de Instrução Normativa por parte da Receita Federal do Brasil disciplinando a nova MP.

Com efeito, a MP introduzindo as novas regras de Preços de Transferência no padrão da OCDE, em conjunto com as alterações do Banco Central e do INPI descritas acima, facilita o ambiente de negócio para as empresas brasileiras e investidores estrangeiros, bem como fomenta o acesso a novas tecnologias para o país a um custo mais eficiente e bem menos burocrático.

Por fim, recomenda-se que as empresas no Brasil revisem os seus contratos com suas partes relacionadas ou entidades localizadas em paraísos fiscais ou sujeitas a regimes fiscais privilegiados, se adequando às novas regras de Preços de Transferência a partir de 01/01/2004, exceto se optarem pela adoção antecipada para o ano-calendário 2023.

Principais contatos:

Alex Jorge
Sócio, Co-head de Tributário e Co-leader do Grupo de Prática de Tax para América Latina do DLA Piper
E: alex.jorge@cmalaw.com

Paula Mena Barreto
Sócia de Propriedade Intelectual e Proteção de Dados
E: paula.menabarreto@cmalaw.com 

Roberto Vianna do R. Barros
Sócio de Bancário e Financiamento
E: rbarros@cmalaw.com

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