Brasil e Reino Unido assinam tratado fiscal 18 jan 2023

Brasil e Reino Unido assinam tratado fiscal

Em 29 de novembro de 2022, o Brasil e o Reino Unido assinaram um Acordo de Dupla Tributação (DTA), há muito esperado. Embora o DTA não entre em vigor até a conclusão dos procedimentos legislativos relevantes exigidos pela legislação brasileira e britânica, suas implicações já são relevantes para as multinacionais que estão, ou estão pensando em operar em ambas as jurisdições. Este é um dos tratados mais favoráveis que o Brasil já firmou. 

Quando em vigor, o DTA estabelecerá as seguintes alíquotas de imposto retido na fonte para tributação sobre os seguintes tipos de rendimentos: 

1. Dividendos (Artigo 10): 

  1. 10% do valor bruto dos dividendos pagos a uma sociedade (beneficiária efetiva) que detenha diretamente pelo menos 10% do capital da sociedade pagadora durante um período de 365 dias; ou  
  1. 15% do valor bruto dos dividendos em todos os demais casos. 

Atualmente, o Reino Unido e o Brasil não impõem um imposto retido na fonte sobre os dividendos, mas o governo brasileiro anterior apresentou um projeto de lei propondo a introdução de um imposto retido na fonte de 15% sobre os pagamentos de dividendos. Se introduzido, o DTA será, portanto, benéfico para as multinacionais que operam no Brasil, especialmente porque a alíquota de 10% é mais baixa do que em muitos outros tratados brasileiros. Consequentemente, é provável que o Reino Unido seja uma escolha popular para as sociedades que investem no Brasil. 

2. Juros (Artigo 11): 

  1. 7% do valor bruto de juros pagos a um banco ou seguradora sobre um empréstimo que foi concedido por um período mínimo de cinco anos para financiar projetos de infraestrutura e serviços públicos; 
  2. 10% do valor bruto dos juros de:
  1. empréstimos concedidos por bancos e companhias de seguros em transações não controladas;
  2. títulos que são negociados regularmente e substancialmente em uma bolsa de valores qualificada;
  3. e venda a crédito de máquinas/equipamentos.

c. 15% em todos os outros casos.

Há, assim, uma redução útil da alíquota de imposto retido na fonte de 20% aplicável sobre juros no Reino Unido, embora muitos dos tratados do Reino Unido reduzam a alíquota a até 0%. No futuro, é provável que valha a pena aos mutuantes brasileiros considerarem a disponibilidade da isenção de colocação privada qualificada (qualifying private placement exemption) do Reino Unido, o que proporcionaria uma isenção total do imposto retido na fonte no Reino Unido, desde que as condições relevantes sejam atendidas. Vale notar, entretanto, que essa isenção só está disponível quando o mutuante e o mutuário não são partes relacionadas. 

Embora a alíquota padrão de retenção doméstica sobre juros no Brasil seja de 15%, esta disposição é útil para reduzir a alíquota de retenção na fonte em transações bancárias e com títulos ou valores mobiliários emitidos em bolsas de valores qualificadas. 

3. Royalties (Artigo 12): 

  1. 10% dos valores brutos de todos os tipos de royalties. 

Como no caso dos dividendos, a alíquota de 10% de retenção na fonte para royalties é inferior à de muitos outros tratados do Brasil. Este é outro exemplo da natureza mais favorável do DTA. 

4. Alíquotas sobre serviços técnicos (Artigo 13): 

  1. Tarifas reduzidas gradativamente serão aplicadas aos preços pagos por serviços administrativos, técnicos ou de consultoria (com certas exceções), como segue: 
  1. 8% do valor bruto dos preços durante os dois primeiros anos;
  2. 4% do valor bruto dos preços durante o terceiro e quarto anos; 
  3. 0% subsequentemente. 

Esta é uma das mudanças mais relevantes na história do DTA pelo Brasil, pois representa uma redução significativa de 15% na alíquota de imposto retido na fonte para tais serviços, especialmente para serviços prestados a longo prazo. Valeria a pena às multinacionais revisarem suas estruturas de serviços intragrupo para considerar o impacto das alíquotas mais benéficas sob este artigo. 

Nos termos do Protocolo ao DTA, se o Brasil concordar com um tratado com outro membro da OCDE (que não seja um estado latino-americano) que inclua alíquotas mais baixas do que as estabelecidas acima, essas alíquotas mais baixas também se aplicarão automaticamente a esse DTA. 

Os DTAs brasileiros mais antigos, em geral, tratam a remuneração por serviços técnicos como royalties, enquanto este DTA distingue entre os dois. Como resultado, este é o primeiro DTA firmado pelo Brasil que proporciona uma alíquota de retenção na fonte mais benéfica em relação a tais serviços (mais uma vez, particularmente quando são prestados a longo prazo) do que a maioria dos DTAs brasileiros (exceções seriam os DTAs do Brasil com a Suiça e com Singapura, que também preveem alíquotas específicas para serviços técnicos mais benéficas do que para royalties). 

Uma inovação relevante do DTA é o acréscimo do parágrafo 2 ao artigo 9 (Empresas Associadas), estabelecendo os ajustes correspondentes de preços de transferência mediante procedimentos amigáveis (MAPs). A recusa de longa data do Brasil em implementar os ajustes correspondentes para eliminar a dupla tributação, conforme

recomendado pelas Diretrizes de Preços de Transferência da OCDE, tem sido alvo de críticas significativas por parte dos parceiros comerciais brasileiros. Assim, a inclusão do Artigo 9(2) é um passo importante para a adoção do padrão arm’s length da OCDE, conforme exigido para a adesão do Brasil a essa Organização. 

Outra novidade relevante para os DTAs do Brasil é o Artigo 24 (Atividades Offshore). Os principais pontos do Artigo 24 incluem: 

 

  1. As atividades realizadas em alto mar por mais de 30 dias no total em qualquer ano fiscal, em conexão com a exploração, exploração ou extração do fundo marinho e subsolo e seus recursos naturais, configurarão estabelecimento permanente (Parágrafos 1 a 4, e 6). 
  2. No que pode ser de interesse para os chamados “nômades digitais”: a remuneração por serviços prestados por um residente de um Estado contratante, proveniente de um emprego ligado a atividades offshore realizadas no outro Estado contratante, pode ser tributada nesse outro Estado (Parágrafo 7). 

 

Além disso, o DTA contém medidas para implementar o padrão mínimo da Ação 6 do BEPS, visando evitar a concessão de benefícios do tratado em circunstâncias inapropriadas. Entretanto, o Brasil ainda não assinou a Convenção Multilateral para Implementar Medidas Relacionadas ao Tratado Tributário para Prevenir a Erosão Base e a Transferência de Lucros e declarou sua intenção de continuar negociando seus tratados bilateralmente. 

O DTA é um marco muito aguardado pelas multinacionais britânicas que atualmente operam (ou que planejam entrar) no mercado brasileiro. Ele contém dispositivos necessários para alcançar uma segurança fiscal e minimizar a dupla tributação. Além do imposto de renda, o escopo dos impostos cobertos pelo DTA inclui a contribuição social brasileira sobre o lucro líquido (CSLL), um desenvolvimento favorável para as empresas britânicas. O artigo sobre o Procedimento Amigável (MAP) visa resolver casos de dupla tributação, mas não inclui previsão para arbitragem. A eficácia da ferramenta de resolução de disputas poderá ser observada apenas na prática. 

De acordo com Alex Jorge, Co-Head de Tax no CMA e Head do Grupo de Práticas LATAM no Campos Mello Advogados em cooperação com o DLA Piper, “o DTA com o Reino Unido representa uma grande mudança na política fiscal externa brasileira, pois segue as regras internacionais de fornecimento de serviços e oferece alíquotas reduzidas de imposto retido na fonte, facilitando o processo de adesão à OCDE e também abrindo caminho para um DTA com os Estados Unidos”. 

Além disso, Randall Fox, Head of International Transfer Pricing da DLA Piper em Londres, declarou que “a implementação do princípio arm’s length no Brasil representa uma mudança fundamental, e , no futuro, este tratado proporcionará um mecanismo para aliviar a dupla tributação entre o Brasil e o Reino Unido.  Esperamos ver mais tratados brasileiros com artigos de MAP no futuro, como resultado de seu compromisso com o princípio do arm’s length”. 

 

English version: https://www.lexology.com/library/detail.aspx?g=89918ed4-b1a4-4a74-9806-6fb8d262e958xx

Para mais informações entre em contato com nosso time de Tributário: 

Alex Jorge
Sócio, Co-Head de Direito Tributário e Co-leader do Latin America Practice Group do DLA Piper
alex.jorge@cmalaw.com 

Humberto Marini
Sócio e Co-Head de Direito Tributário
humberto.marini@cmalaw.com 

Flavia Ganzella
Sócia
flavia.ganzella@cmalaw.com

Leonardo Rzezinski
Sócio
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Renato Lopes da Rocha
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Victor Kampel 
Sócio
victor.kampel@cmalaw.com 

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