28 out 2025

Consórcios integrados pela Petrobras são regidos pelo RLCP?

Por Carolina Caiado e Carolina Pazzoti

Com o advento da Lei das Estatais (Lei nº 13.303/2016) as empresas públicas e sociedades de economia mista passaram a ter a obrigação de elaborar regulamentos internos específicos para disciplinar tanto os procedimentos licitatórios quanto a celebração de contratos administrativos (art. 40). Nesse cenário, com o objetivo de estabelecer diretrizes gerais para suas contratações, a Petrobras instituiu o seu Regulamento de Licitações e Contratos (RLCP), que detalha as modalidades de contratação, as fases do processo licitatório, os mecanismos de gestão contratual e os procedimentos auxiliares.

Entre os dispositivos que tratam das contratações realizadas pela Petrobras, destaca-se o art. 228 do RLCP, que institui um regime jurídico próprio para a aquisição de bens e serviços destinados aos consórcios por ela operados. Conforme dispõe o referido artigo, tais contratações, quando voltadas exclusivamente ao atendimento das necessidades dos consórcios liderados pela Petrobras, submetem-se ao regime jurídico de direito privado, de modo que as disposições estabelecidas pela Lei nº 13.303/2016 não são aplicáveis.

A inaplicabilidade das disposições da Lei das Estatais se dá justamente pelo fato de que os consórcios nos quais a Petrobras figura como consorciada e operadora não integram a Administração Pública indireta da União; tampouco podem ser considerados subsidiárias das Petrobras. Os consórcios constituídos nos termos do art. 279 da Lei das S.A. não dão origem a pessoas jurídicas novas, tratando-se de associação empresarial regida por normas de direito privado, nas quais figuram como consorciadas as próprias pessoas jurídicas que o integram.

Em razão do art. 1º, § 5º, da Lei das Estatais, a Petrobras, enquanto consorciada, deve seguir as disposições da Lei 13.303/2016, tendo em vista que continua sendo uma sociedade de economia mista. Isto é, a Lei das Estatais se aplica apenas à estatal consorciada e não ao consórcio em si. Portanto, não há incidência da Lei 13.303/2016 nos casos em que a Petrobras adquire bens ou serviços para o consórcio, na qualidade de operadora, devendo ser aplicadas as regras de direito privado.

Rigidez menor

Tendo em vista que a Lei das Estatais não incide sobre as contratações que visam a atender exclusivamente as demandas dos consórcios liderados pela Petrobras, a regra geral de que as contratações públicas devem ser precedidas de processo licitatório, prevista no art. 28 da Lei 13.303/2016, também não é aplicável a essas hipóteses. Com isso, as aquisições realizadas pela Petrobras para atender exclusivamente às necessidades do consórcio não estão sujeitas às exigências formais da Lei das Estatais, como a realização de licitação, de modo que as contratações podem ser conduzidas com maior flexibilidade, desde que observados os princípios da Administração Pública.

Ressalta-se que o art. 228 do RLCP possui redação muito semelhante à do art. 1º, § 7º, do Decreto Federal nº 9.355/2018, que versa sobre o procedimento especial de cessão de direitos de exploração, desenvolvimento e produção de petróleo, gás natural e outros. O referido dispositivo legal também prevê que contratações de bens e serviços efetuadas pelos consórcios liderados pela Petrobras estão sujeitas ao regime jurídico de direito privado, não sendo aplicável o processo licitatório.

Entendimento

Embora os dispositivos do RLCP e do Decreto Federal nº 9.355/2018 estejam válidos e vigentes, a sua legalidade e constitucionalidade foi questionada por meio de processos em trâmite no Supremo Tribunal Federal (STF) e Tribunal de Contas da União (TCU).

No âmbito da ADI 5942¹, o STF declarou a constitucionalidade do art. 1º, §7º do Decreto Federal. O Supremo entendeu que devem ser observados os princípios que regem a Administração Públicas nas contratações a serem realizadas pelos consórcios liderados pela Petrobras, dispensada a realização de procedimento licitatório, independentemente do percentual de participação da estatal na composição do consórcio. Logo, ainda que a participação da Petrobras no consórcio seja minoritária, nas contratações realizadas para atender as demandas do consórcio, devem ser observados os princípios da Administração Pública, tais como publicidade, transparência e moralidade.

No TCU, está em trâmite a Representação nº 022.517/2017-6², que versa sobre possíveis irregularidades concernentes a aplicações e interpretações equivocadas de regras gerais de procedimentos licitatórios. O objetivo da Representação é justamente identificar o afastamento indevido, pela Petrobras, do regramento estatutário de licitação e contratos previsto na Lei 13.303/2016 e RLCP.
A instauração do processo demonstra que as contratações realizadas por consórcios operados pela Petrobras, com fundamento no art. 228 do RLCP e art. 1º, §7º, do Decreto nº 9.355/2018, estão na pauta da fiscalização da Corte de Contas. Ainda que o STF tenha reconhecido a legalidade de contratações com fundamento no art. 228 do RLCP, o tema ainda suscita discussões no âmbito do TCU.

Seguiremos acompanhando os desdobramentos do tema no TCU. Estejam atentos às próximas edições da P&N!


[1] ADI 5942/DF. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5459537

[1] Representação nº 022.517/2017-6. Disponível em: https://pesquisa.apps.tcu.gov.br/documento/processo/*/NUMEROSOMENTENUMEROS%253A2251720227/DTAUTUACAOORDENACAO%2520desc%252C%2520NUMEROCOMZEROS%2520desc/0

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