Extinção consensual de contrato de concessão: o que motivou recente decisão favorável do TCU sobre o tema 25 fev 2025

Extinção consensual de contrato de concessão: o que motivou recente decisão favorável do TCU sobre o tema

Por Carolina Caiado e Marjorie Iacoponi

No último dia 05, o TCU aprovou a extinção consensual do contrato de concessão (Edital 001/2008) firmado entre a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e a ViaBahia Concessionária de Rodovias S. A. (ViaBahia)[1], em solicitação formulada pela própria agência. Desde 2009, a ViaBahia é responsável pela operação e exploração das rodovias federais BR-324 e BR-116 e da rodovia estadual BA526/52.

A decisão é mais um capítulo de um método consensual de solução de conflitos que vem sendo aplicado pelo Tribunal. Nos últimos anos, o TCU tem se dedicado à prevenção de conflitos entre particulares e autoridades públicas, reforçando seu compromisso com a segurança jurídica.

Contexto
Desde o início da concessão, a Via Bahia enfrentou uma série de dificuldades para cumprir as metas de obras e serviços previstos no contrato. A ANTT constatou a falta de investimentos no ativo rodoviário, apontando irregularidades na pavimentação, execução e manutenção de obras de artes especiais, entre outros. A controvérsia central entre ANTT e Via Bahia dizia respeito à interpretação da cláusula do contrato de concessão que disciplina a revisão quinquenal do contrato de concessão por parte da ANTT. As partes divergiam quanto à forma de realização e alcance da revisão.

Passados sete anos de execução contratual, a Via Bahia ajuizou ação judicial em face da ANTT e obteve sentença favorável[2], por meio do qual o Poder Judiciário suspendeu as obrigações da concessionária de realizar os investimentos previstos e a aplicação de sanções pela ANTT, incluindo a impossibilidade de decretar a caducidade do Contrato até a conclusão da primeira revisão quinquenal.

Em 2019, a concessionária ingressou com requerimento arbitral para resolução da controvérsia com a ANTT. Os pleitos de maior materialidade apresentados pela concessionária estavam relacionados ao desequilíbrio advindo dos efeitos da depressão da economia nacional sobre o Plano de Negócios da Concessão e impactos do solo massapê em determinados trechos das rodovias, que geravam dificuldades para a concessionária em frear a deterioração estrutural da rodovia e alcançar as  metas de qualidade para o pavimento. O procedimento arbitral discute valores de mais de R$ 9.5 bilhões.

No final de 2023, a ANTT procurou o TCU para uma solução consensual. Quando as partes recorreram ao TCU, havia mais de 60 ações judiciais em curso, incluindo ações anulatórias de multa, execuções fiscais e ações civis públicas ajuizadas pelo Ministério Público, sem contar o processo arbitral e o processo administrativo de caducidade instaurado pela ANTT.

Acordo
A Secex Consenso conduziu análise das obras, cláusulas contratuais e da modelagem econômico-financeiro, trabalho que incluiu inspeções in loco dos auditores do Tribunal. As áreas técnicas do TCU autorizaram a celebração do termo de autocomposição entre a ANTT e a concessionária mediante o cumprimento de condicionantes relacionadas à apresentação ou melhoria de justificativas técnicas.

Para o TCU, o acordo apresentou-se como opção viável para a solução das controvérsias, ao invés de a ANTT seguir buscando êxito em litígios que se arrastariam por anos e que não apresentavam previsão de encerramento em horizonte razoável. A rodovia requer importantes reparos e melhorias. A continuação dos litígios seria prejudicial ao interesse público e aos usuários da rodovia.

O TCU concluiu que o acordo não serviu como incentivo a comportamentos oportunistas. Conforme ponderou o Ministro Relator Antonio Anastasia em seu voto, o resultado da negociação com a ViaBahia não deve servir como “incentivo à litigância de concessionárias, na esperança de uma renegociação futura” uma vez que “não é economicamente racional atuar deliberadamente para realizar o mínimo possível de investimentos e, ao final, em uma renegociação, receber uma indenização menor do que o capital investido ou ao seu déficit de fluxo de caixa”.

Secex Consenso
A Secretaria de Controle Externo de Solução Consensual e Prevenção de Conflitos (Secex Consenso) é uma secretaria do TCU com foco na condução de procedimentos para solução consensual de controvérsias e prevenção de conflitos no âmbito da Administração Pública Federal.

A Secex Consenso foi instituída pelo TCU em 2022 pela Instrução Normativa TCU nº 91/2022. Além de representantes do Tribunal, a Secex Consenso é composta por um representante de cada órgão ou entidade da Administração Pública Federal que tenha solicitado a solução consensual ou que tenha manifestado interesse na solução.

Com a Secex Consenso, o TCU procura aumentar a eficiência e a economicidade do Estado por meio do diálogo entre o setor privado e a administração pública federal. Se as partes chegam a um consenso, a tendência é a redução do número de ações judiciais decorrentes das decisões do TCU. O acordo traz maior previsibilidade às partes, pois já há uma decisão que julga suas respectivas ações, bem como os impactos à relação contratual e ao erário.

Cautela
A extinção do contrato de concessão por acordo deve ser avaliada e aplicada com cautela. Da decisão do TCU em relação ao caso Via Bahia, extrai-se que o acordo para extinção da concessão deve ser aplicado de forma criteriosa, conforme a análise do caso concreto, de modo a evitar que a solução consensual torne-se incentivo ao descumprimento de obrigações contratuais.

No caso do acordo entre o Poder Concedente e a concessionária ViaBahia, evitou-se a continuidade de litígios judiciais, administrativos e arbitragem, além de impedir que eventuais desequilíbrios se perpetuassem no tempo em prejuízo aos usuários da rodovia.

Ao participar da licitação e assinar o contrato de concessão, o Poder Público presume que a concessionária atuou de boa-fé, e que se preparou economicamente para cumprir todas as obrigações pactuadas. Durante uma crise financeira, a concessionária deve estudar todas as alternativas possíveis para garantir que as obrigações contratuais continuem sendo cumpridas sem colocar em risco sua saúde financeira a longo prazo.

Acordos são bem-vindos mas não podem se tornar incentivo à litigância de concessionárias, na esperança de uma renegociação futura, como bem pontuou o TCU.

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[1] Acórdão disponível em: https://portal.tcu.gov.br/imprensa/noticias/tcu-aprova-encerramento-consensual-do-contrato-entre-antt-e-viabahia . Acesso em 14.02.2025.

[2] Ação Judicial nº 1009371-92.2017.4.01.3400. Justiça Federal da Bahia – PJE Bahia. Acesso em 14.02.2025.

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