Algumas Ilegalidades da Instrução Normativa RFB 1.862/2018 24 abr 2019

Algumas Ilegalidades da Instrução Normativa RFB 1.862/2018

No dia 28 de dezembro de 2018 foi publicada a Instrução Normativa RFB nº 1.862/18, que dispõe sobre o procedimento de imputação de responsabilidade tributária no âmbito da Secretaria da Receita Federal do Brasil.

É relevante destacar, desde já, que o procedimento de imputação de responsabilidade consiste na atribuição de responsabilidade tributária a terceiro que não consta da relação tributária como contribuinte ou como substituto tributário, nos termos do inciso II do parágrafo 1° do artigo 1° da Instrução Normativa RFB nº 1.862/18. Ou seja, a Instrução Normativa em questão tem como destinatários os terceiros passíveis de serem enquadrados como responsáveis, nos termos do art. 121, II, do CTN.

Como se verá adiante, a IN RFB nº 1.862/18 foi além da sua restrita e limitada competência meramente regulamentar, tendo instituído novas hipóteses de responsabilidade tributária.

O presente artigo traz uma análise sintética de algumas ilegalidades verificadas nas disposições da IN RFB nº 1.862/18.

1 – Breve Introdução acerca da Responsabilidade Tributária na Constituição Federal e no Código Tributário Nacional

De início, é importante salientar que o art. 5°, LIV, da CF/88 estabelece que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal. O inciso seguinte prescreve que aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

Portanto, para que alguém seja privado de sua liberdade ou bens, é indispensável o respeito ao devido processo legal, preservando-se o contraditório e a ampla defesa também no processo administrativo.

O devido processo legal se manifesta sob duas vertentes: (i) formal e (ii) material. A primeira, que vai além do simples cumprimento de rituais formalistas, exige que a atuação do Estado observe as formalidades substantivas exigidas pela Magna Carta, dentre as quais, por exemplo, podemos mencionar o respeito ao processo legislativo e às competências definidas pela Constituição Federal. Já a segunda vertente atua de forma a mitigar o alcance do poder legiferante do Estado ao exigir que os veículos normativos não sejam abusivos ou desproporcionais.

O art. 146, III, ‘b’, da CF/88 prescreve que cabe à Lei Complementar estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre obrigação e lançamento.

A Lei Complementar a que alude o referido dispositivo constitucional é o Código Tributário Nacional, aprovado pela Lei n° 5.162, de 25 de outubro de 1966. O CTN foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988 com status de Lei Complementar.

O art. 142 do CTN preceitua que “compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.

Portanto, é através do lançamento tributário previsto no art. 142 do CTN que a Receita Federal tem de verificar a ocorrência concreta da hipótese de incidência prevista na legislação tributária, de modo a formalizar a obrigação tributária com a instituição do crédito tributário, apontando o sujeito passivo (contribuinte ou responsável).

É fundamental ter em mente que o lançamento é espécie de ato administrativo, o qual encontra-se adstrito aos princípios da legalidade e moralidade da Administração Pública, sem olvidar que é imperiosa a observância aos princípios do contraditório e ampla defesa na imputação de responsabilidade pelo crédito tributário ao sujeito passivo.

Nesse sentido, encampando orientação firmada no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF, o parágrafo único do artigo 3° da IN RFB n° 1.862/18 prescreve que o “auditor-fiscal da Receita Federal deverá reunir as provas indispensáveis à comprovação da responsabilidade tributária”, sob pena de nulidade do referido procedimento, como se vê da ementa do seguinte acórdão do CARF:

“(…)

SUJEIÇÃO PASSIVA. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA SOLIDÁRIA. EXCLUSÃO. RESP Nº 731.308-MG. INAPLICABILIDADE.

A responsabilidade tributária deve ser comprovada pela fiscalização, mesmo nos casos em que há presunção de ocorrência do fato gerador, com base no art. 42 da Lei nº 9.430/96. Em não havendo a comprovação de conduta dolosa transgressora da lei, do contrato social ou dos estatutos da empresa, não há que se manter a responsabilização do sócio ou administrador.

Inaplicável ao caso o REsp nº 731.308-MG, que estabelece o ônus do responsável de provar que não realizou a conduta dolosa, pois tal precedente é calcado na presunção de liquidez e certeza da Certidão da Dívida Ativa. No procedimento administrativo, cabe à fiscalização realizar tal prova.”[1]

O processo administrativo de determinação e exigência dos créditos tributários da União é regido pelo Decreto n° 70.235, de 06 de março de 1972. O aludido Decreto foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988 com status de Lei Ordinária.

Dentre as disposições do Decreto n° 70.235/1972, destacamos o artigo 9°, segundo o qual “a exigência do crédito tributário e a aplicação de penalidade isolada serão formalizados em autos de infração ou notificações de lançamento, distintos para cada tributo ou penalidade, os quais deverão estar instruídos com todos os termos, depoimentos, laudos e demais elementos de prova indispensáveis à comprovação do ilícito.” Em face da autuação ou notificação de lançamento é prevista a possibilidade de apresentação de Impugnação e, posteriormente, Recurso Voluntário pelo sujeito passivo, sendo certo que o julgamento, em segunda instância, compete “ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, órgão colegiado, paritário, integrante da estrutura do Ministério da Fazenda, com atribuição de julgar recursos de ofício e voluntários de decisão de primeira instância, bem como recursos de natureza especial.

Em que pese as disposições do Decreto n° 70.235/72, a IN RFB n° 1.862/18 dispensa tratamento distinto aos responsáveis em situação equivalente, com evidente desrespeito ao princípio da equidade, posto que deverão ser observados procedimentos e prazos diferentes, o que também viola os princípios do contraditório e da ampla defesa.

Feitos os esclarecimentos iniciais, passamos aos comentários da IN RFB n° 1.862/2018.

2 – Ilegalidades na Imputação de Responsabilidade pela IN RFB 1.862

Como exposto acima, a IN RFB Nº 1.862/18 instituiu novos procedimentos para imputação de responsabilidade a terceiros no âmbito da Secretaria da Receita Federal do Brasil (débitos não inscritos em dívida ativa da União).

O argumento utilizado pela Receita Federal para editar esta norma foi de que o antigo regramento previsto na Portaria RFB nº 2.284/2010, possuía diferentes lacunas em relação aos procedimentos para imputação de responsabilidade a terceiros no que tange o lançamento de ofício.

Entretanto, a Receita Federal foi muito além de simples atualização da norma anterior, tendo incorrido em evidentes ilegalidades.

A prática do contencioso tributário no Brasil tem demonstrado uma conduta que se tornou praxe pela administração tributária: a indicação de terceiros como corresponsáveis pelo crédito tributário, não raras vezes sem qualquer indicação mínima de violação ao art. 135 do CTN, fazendo com que caiba ao sujeito passivo a difícil quiçá impossível produção de prova negativa de que não houve prática de atos com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.

Vale lembrar que o mero inadimplemento tributário não é causa de aplicação do art. 135 do CTN, conforme reiterada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

Além disso, não obstante a controvérsia acerca da competência conferida à Lei Complementar, também é muito provável a aplicação das hipóteses trazidas pela IN RFB n° 1.862/18 aos grupos econômicos, por força da aplicação irrestrita do art. 30, IX, da Lei nº 8.212/91. Não é demais recordar que o CTN exige a comprovação de “interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal”, a teor do art. 124, I, do CTN. O interesse a que alude o referido dispositivo é o jurídico (situação que constitua o fato gerador), e não o interesse meramente econômico, como se infere da seguinte ementa de acórdão do CARF:

“(…)

SUJEIÇÃO PASSIVA. ARTIGO 124, I, DO CTN

Conforme pacificada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, não se apura responsabilidade tributária de quem não participou da elaboração do fato gerador do tributo, não sendo bastante para a definição de tal liame jurídico obrigacional a eventual integração interempresarial abrangendo duas ou mais empresas da mesma atividade econômica ou de atividades econômicas distintas.

Da mesma forma, ainda que se admita que as empresas integram grupo econômico, não se tem isso como bastante para fundar a solidariedade no pagamento de tributo devido por uma delas, ao ponto de se exigir seu adimplemento por qualquer delas.

Para que se esteja diante da responsabilização solidária prevista no art. 124, I, do CTN, é necessária a constatação e a prova da participação conjunta de pessoas quando da ocorrência do fato gerador, devendo estas serem copartícipes diretas das infrações imputadas pelo Fisco, o que não se estampou no caso concreto, mais ainda porque o interesse comum a que alude mencionado dispositivo legal não é simplesmente o societário, econômico e finalístico que o grupo e os seus titulares naturalmente têm na exploração dos negócios mercantis pela pessoa jurídica, mas, a participação direta das empresas responsabilizadas na realização dos fatos geradores colhidos pelo Fisco, e esta não houve restou provada adequadamente nos autos.

Responsabilização solidária com fulcro no artigo 124, I, do CTN, que se afasta.”[2]

1.1. Atribuição de responsabilidade em despacho decisório em processo de compensação

O art. 8º da IN RFB nº 1.862/18 trouxe a hipótese de imputação de responsabilidade tributária diretamente no despacho decisório que não homologar a compensação de débitos e créditos tributários federais, com expresso fundamento no parágrafo 6° do art. 74 da Lei n° 9.430/96, in verbis:

“Art. 74 (…)

6° A declaração de compensação constitui confissão de dívida e instrumento hábil e suficiente para a exigência dos débitos indevidamente compensados. (Redação dada pela Lei nº 10.833, de 2003)”

A simples leitura do parágrafo 6° do artigo 74 da Lei n° 9.430/1996 já denota a ilegalidade do procedimento de que trata a referida instrução normativa, tendo em vista que a declaração de compensação constitui confissão de dívida dos débitos informados na DCOMP, sendo suficiente para a cobrança apenas de tais valores. Qualquer cobrança estranha aos débitos confessados e, mais do que isso, imputação de responsabilidade a terceiros tem, obrigatoriamente, de seguir as regras estabelecidas no Decreto n° 70.235/72, inclusive sob pena de violação ao art. 142 do CTN.

Ora, além do lançamento tributário ser ato privativo da autoridade administrativa, por meio do qual tem de ser apontados todos os requisitos exigidos pelo art. 142 do CTN, ainda é importante salientar que a declaração de compensação é um procedimento iniciado pelo sujeito passivo com a finalidade de compensação de créditos tributários. A DCOMP jamais poderá substituir o lançamento de ofício pela administração tributária, tendo em vista que seu objeto é restrito à compensação tributária, inclusive representando o exercício legítimo do direito à compensação e de peticionar aos órgãos da administração pública.

Isto, por si só, já configura ofensa direta ao princípio da legalidade, uma vez que somente a lei, em sentido estrito, pode criar hipótese de atribuição de responsabilidade tributária. Acerca disto, frise-se que a Lei nº 9.430/1996, que autorizou os procedimentos para compensação de tributos e contribuições federais não prevê a transferência de responsabilidade tributária tal como ora pretendida pela Receita Federal.

Em situação análoga, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que o Poder Executivo não pode criar hipóteses de responsabilidade tributária, sob pena de ofensa ao princípio da reserva legal:

“TRIBUTÁRIO. ICMS. SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. DEFINIÇÃO DO FATO GERADOR. RESERVA LEGAL. NOMENCLATURA BRASILEIRA DE MERCADORIAS/SISTEMA HARMONIZADO (NBM/SH)

I – Não atende ao princípio da reserva legal, o dispositivo da Lei estadual capixaba 5.298/96, que transfere ao Poder Executivo a competência para atribuir responsabilidade tributária a quem comercia, “toda e qualquer mercadoria classificada na Nomenclatura Brasileira de Mercadorias/Sistema Harmonizado – NBM/SH”. A NBM/SH é uma relação que abarca todos os bens suscetíveis de comércio lícito no Brasil, não podendo ser colocado no comércio, qualquer bem que nela não esteja relacionado. Com efeito, se a relação envolve “toda e qualquer mercadoria”, a Lei transferiu ao Executivo a competência para impor responsabilidade substitutiva em relação a todos os ramos de comércio, indistintamente.

II – Quando o Legislador, no Art. 6º da Lei Complementar 87/96 concedeu à lei estadual o condão de atribuir o encargo de substituto tributário, ele quis que o Poder Legislativo Estadual determinasse os casos e as pessoas em que o encargo deve recair. Dizer que o encargo pode incidir, a critério do Poder Executivo, sobre quem comercia qualquer objeto suscetível de mercancia lícita é fraudar o princípio da reserva legal. Em assim fazendo, o Legislador está generalizando, jamais, determinando. (…)”[3]

Destaque-se, ainda, que não há qualquer motivação para a Receita Federal incluir outros responsáveis pela mera não homologação de compensação tributária, o que termina por criar a presunção de má-fé de todo contribuinte que formula pedido de compensação, o que já ocorre atualmente com a cobrança da inconstitucional multa isolada sobre o valor do débito objeto de compensação não homologada.

Por fim, mutatis mutandis, é possível verificar o mesmo racional no julgamento do Agravo Regimental em Recurso Especial nº 1.126.548/RS, pelo Superior Tribunal de Justiça, sob relatoria do então Min. Luiz Fux.

Naqueles autos, a União pretendia a execução prévia de supostos débitos tributários, os quais tiveram sua origem em virtude da não homologação de compensações feitas pelo contribuinte.

Nesse cenário, o STJ decidiu pela impossibilidade de cobrança prévia desses débitos, uma vez que “a compensação, que teria o condão de extinguir o crédito tributário, não foi aceita, e o ato de discuti-la torna logicamente impossível que se exija o pagamento do valor de cuja compensação se cogita”, terminando por concluir que “trata-se de imposição dos princípios do devido processo legal administrativo, da ampla defesa e do contraditórios, e do direito de petição.”

Destarte, a simples rejeição de compensação tributária não pode justificar a imputação de responsabilidade a terceiros, inclusive pelo fato de a IN em questão se fundamentar em dispositivo legal que jamais autorizou tal procedimento. Caso a Receita Federal entenda que houve violação a justificar a atribuição de responsabilidade tributária contra terceiros, então deverá promover a lavratura de auto de infração, observando os princípios do contraditório, ampla defesa e devido processo legal, em linha com o art. 142 do CTN e tramitação regida pelo Decreto n° 70.235/72.

1.2. Atribuição de Responsabilidade entre o Lançamento de Ofício e a Decisão de Primeira Instância Administrativa

O Capítulo II da Instrução Normativa em questão trata da hipótese de responsabilização de terceiros, caso sejam identificados “fatos novos” ou “subtraídos do conhecimento”, sendo permitido à autoridade administrativa a inclusão deste novo responsável no lançamento de ofício já realizado, veja-se:

“Art. 12. Caso o processo administrativo fiscal esteja pendente de julgamento em primeira instância, será emitido Termo de Devolução de Processo para Imputação de Responsabilidade por Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil, que será anexado ao processo. (…)

Art. 13. Identificada a hipótese a que se refere o art. 11, o Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil lavrará Termo de Imputação de Responsabilidade Tributária, que deve conter os requisitos previstos no art. 3º.

1º O sujeito passivo responsabilizado de acordo com o disposto no caput poderá impugnar o crédito tributário lançado e o vínculo de responsabilidade constantes do Termo de Imputação de Responsabilidade Tributária no prazo de 30 (trinta) dias.

2º Os demais sujeitos passivos serão cientificados do termo a que se refere o caput e poderão manifestar-se exclusivamente quanto à imputação de responsabilidade nele contido no prazo de 30 (trinta) dias. (…)”

Em primeiro lugar, tem-se que a previsão de “emendar” ou “complementar” o lançamento de ofício foi pensada pela administração pública com a finalidade de tentar superar o transcurso do prazo decadencial. Ora, não é dado ao Fisco aplicar subterfúgios para passar ao largo das regras que estipulam o prazo decadencial para a constituição do crédito tributário.

A previsão ora contida na IN RFB n° 1.862/18 não se adequada aos termos do art. 149 do CTN, sobretudo porque a revisão do lançamento (i) acarreta, obrigatoriamente, no cancelamento do lançamento anterior e a realização de novo lançamento, nos termos do art. 142 do CTN e regido pelo Decreto n° 70.235/72, sem olvidar que (ii) a revisão só pode ser iniciada enquanto não extinto o direito da Fazenda Nacional.

O CARF não admite a revisão do lançamento ao largo das hipóteses do art. 149 do CTN:

“(…)

ARTIGO 149 DO CTN. REFISCALIZAÇÃO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO E MOTIVAÇÃO. IMPROCEDÊNCIA DA AUTUAÇÃO. A revisão de lançamento fiscal somente é cabível no caso da fiscalização fundamentar e motivar a ocorrência de uma ou mais hipóteses permissivas constantes do artigo 149 do CTN, sob pena de improcedência do Auto de Infração.

LANÇAMENTO DE OFÍCIO. MODIFICAÇÃO DE CRITÉRIO JURÍDICO. ERRO DE DIREITO. VEDAÇÃO. É vedada à administração pública o reexame de matéria e período já fiscalizados com base na mudança de critério jurídico e/ou erro de direito. (…)”[4]

Portanto, é ilegal a previsão contida na IN RFB n° 1.862/18, tendo em vista que não está em linha com as normas do art. 149 do CTN.

1.3. Imputação de Responsabilidade após a Constituição Definitiva do Crédito Tributário

Nos termos o art. 15 da IN RFB nº 1.862/18, a imputação da responsabilidade a terceiro, após a constituição definitiva dos créditos tributário e previamente à inscrição em dívida ativa, poderá ocorrer em 03 (três) situações distintas:

(i) quando o lançamento ou despacho decisório não tiver sido contestado pelo sujeito passivo original;

(ii) após o julgamento definitivo pela autoridade administrativa, o qual reconheceu a validade do crédito tributário; e

(iii) quando o sujeito passivo original confessa o débito.

Sem prejuízo das ilegalidades acima, o procedimento de imputação de responsabilidade de que o Capítulo III da referida instrução normativa é igualmente ilegal.

O procedimento em questão não observará os ditames do Decreto n° 70.235/72, mas será regido pela Lei n° 9.784/99.

É flagrante a violação aos princípios da equidade e do duplo grau de jurisdição.

O prazo para apresentação de Impugnação e Recurso Voluntário no Decreto n° 70.235/72 é de 30 (trinta) dias.  Já o prazo para apresentação de recurso nos termos da Lei n° 9.784/99 é de apenas 10 (dez) dias, o que denota que os sujeitos passivos submetidos ao malsinado procedimento de imputação de responsabilidade tributária após a constituição definitiva do crédito tributário sofrerão frontal violação aos princípios da ampla defesa e da equidade.

Além disso, os Recursos Voluntários submetidos ao Decreto n° 70.235/72 serão analisados pelo CARF, órgão ad quem, colegiado e paritário. Sem prejuízo das controvérsias envolvendo o voto de qualidade no âmbito do CARF, é indiscutível que o fato do referido Tribunal ser paritário mitiga a posição de inferioridade do contribuinte frente ao fisco, dando maior efetividade ao princípio da ampla defesa, inclusive com a possibilidade de sustentação oral nas sessões de julgamento.

Já o recurso administrativo submetido ao rito da Lei n° 9.784/99 será apreciado dentro da estrutura interna da Receita Federal, analisado exclusivamente por auditores-fiscais, inclusive sem a possibilidade de realização de sustentação oral. Vale lembrar que várias seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil propuseram medidas judiciais com a finalidade de assegurar o direito à sustentação oral nas sessões de julgamento das Delegacias de Julgamento da Receita Federal.

3 – Conclusão

Sem a pretensão de esgotar o tema, este artigo apontou algumas das ilegalidades cometidas pela Receita Federal ao editar a IN RFB n° 1.862/2018, a qual terminará por incentivar a continuidade da litigiosidade entre administração tributária e sujeitos passivos no Brasil, inclusive com a judicialização dos temas relacionados aos procedimentos de imputação de responsabilidade tributária, com severos impactos à segurança jurídica, que é valor essencial para o ambiente de negócios no Brasil.

[1] Processo Administrativo n° 13855.003418/2009-14 – Acórdão n° 1301-003.160 – Sessão em 12/06/2018.

[2] Processo Administrativo n° 19515.720648/2016-08 – Acórdão n° 1402-003.583 – Sessão em 21/11/2018.

[3] RMS 11.600/ES, Rel. Ministro Humberto Gomes de Barros, Primeira Turma, julgado em 14/08/2001, DJ 01/10/2001, p. 162.

[4] Processo Administrativo n° 16643.720068/2013-14 – Acórdão n° 1201-001.687 – Sessão em 17/05/2017.

 

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