A Potencial reviravolta das regras de publicidade e propaganda de medicamentos no Brasil 20 ago 2024

A Potencial reviravolta das regras de publicidade e propaganda de medicamentos no Brasil

Nova decisão do STJ pode redefinir regras no setor de saúde, incluindo a RDC 96/2008

Em 14 de agosto de 2024, a ministra Regina Helena Costa, do STJ, decidiu que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) não pode, de maneira autônoma, impor restrições à publicidade de medicamentos que extrapolem os limites legais já estabelecidos (STJ – Consulta Processual). A decisão foi unânime e reforça que a Anvisa deve apenas fiscalizar, sem criar obrigações para o setor. A resolução se alinha com o entendimento de que compete à legislação federal, e não a atos normativos da Anvisa, regular a propaganda de produtos farmacêuticos.

A que se trata o objeto desta decisão, a Resolução RDC 96/2008, publicada pela Anvisa em 18 de dezembro de 2008, esta estabelece regras detalhadas para a propaganda e publicidade e outras práticas com a finalidade de divulgação ou promoção comercial de medicamentos. Sua incidência regulatória recai sobre todo e qualquer material que utiliza técnicas de comunicação com o objetivo de promover e/ou induzir à prescrição, dispensação, aquisição e utilização de medicamento. Cumpre salientar que suas regras valem para todos os meios de comunicação, compreendendo as redes sociais, e em concordância com o Código de Ética, onde caberá ao farmacêutico a responsabilidade de supervisionar os conteúdos apresentados pelo estabelecimento com o qual mantém vínculo, assegurando o cumprimento das normas técnicas e da legislação vigente.

Para mais, em que pese suas obrigações e disposições, a resolução imprimi importante direcionamento para com o setor de saúde e fármaco no Brasil, ao passo que busca garantir que as informações divulgadas ao público sejam claras, seguras e responsáveis, protegendo o consumidor de práticas enganosas. A norma impõe restrições à veiculação de publicidade em determinados formatos, exige avisos obrigatórios e limita o uso de expressões que possam induzir o público a erro. Isso ajuda a manter a integridade das informações e a confiança no setor, promovendo um equilíbrio entre o acesso à informação e a segurança do consumidor.

Essas regulamentações também influenciam diretamente na estratégia de comunicação das empresas farmacêuticas, impactando suas operações de marketing e, consequentemente, seu posicionamento no mercado. Nesse sentido, a RDC 96/2008 atua como um importante instrumento de controle, estabelecendo parâmetros que direcionam a atuação das empresas e evitando práticas abusivas.

Contudo, em meio à tais limitações impostas pela resolução, a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça acompanhou, por unanimidade, a posição da relatora, ministra Regina Helena Costa, de que a Anvisa deve limitar seu poder normativo à fiel execução da Lei 9.294/1996, que disciplina as restrições às propagandas de medicamentos. O recurso tratou da legalidade de sanções impostas a uma empresa farmacêutica com base na RDC 96/2008, onde foi concluído que a agência reguladora extrapolou as limitações impostas no artigo 7º, inciso XXVI, da referida Lei.

O colegiado, de maneira inédita, decidiu comunicar o resultado do julgamento ao Ministério da Saúde e ao Congresso Nacional para que se avalie a pertinência de uma possível alteração na lei interpretada na ação. O ineditismo da medida foi ressaltado pela ministra Regina Helena Costa, que defendeu ser “adequada, sem caráter cogente (obrigatório) e a mero título sugestivo.”

À vista disso, a ministra ainda frisou que, embora não seja apropriado validar normas infralegais que contrariam a lei ou determinar ações ao Congresso Nacional, é válido comunicar o teor da decisão às autoridades competentes. Seu objetivo é incentivar um diálogo que possa catalisar uma reflexão mais profunda entre os atores políticos responsáveis por deliberar sobre o tema, dada a convergência de preocupações entre esses agentes. Dessa forma, a decisão visa a estimular ajustes normativos em um contexto legislativo adequado.

Neste ditame, se a decisão for mantida, ela poderá provocar mudanças expressivas no setor farmacêutico. O Congresso e Ministério da Saúde poderão avaliar, sob o prisma do artigo 220 da Constituição Federal, cujo texto delimita que competirá à lei federal fixar regras para a propaganda de medicamentos, se o horizonte regulatório para publicidade e propaganda de medicamento no Brasil poderá ser passível de mudanças.

Sendo assim, as modificações poderão ser acerca dos contornos da propaganda de medicamentos, estabelecendo novas cadeias permissivas e restritivas, ou mesmo da competência legalmente atribuída à Anvisa para tratar do tema. As empresas precisarão, portanto, revisar e pormenorizar rapidamente suas práticas para se adaptar às novas possibilidades de comunicação, o que pode aumentar a competitividade e a presença de campanhas mais agressivas no mercado, não perdendo de vista o comprometimento com a clareza, integridade e segurança das informações divulgadas ao público.

O impacto dessa mudança é ainda mais relevante considerando o crescimento do mercado farmacêutico no Brasil. Em 2024, o setor deve ainda atingir um crescimento 12,6%, com projeções otimistas para 2025 – em valores, segundo a IQVIA -, isso devido à alta demanda e inovações tecnológicas. O Brasil já é o sexto maior mercado farmacêutico do mundo, e a mudança para fins de possíveis flexibilizações na regulação publicitária pode intensificar ainda mais esse crescimento, ampliando o acesso a novos públicos e aumentando o volume de vendas. As empresas, no entanto, precisarão equilibrar essa nova “liberdade” com práticas responsáveis, diante de um setor onde a imagem e a confiança do consumidor são fundamentais​.

Esse novo cenário sugere um potencial de transformações significativas para o ambiente de negócios da indústria farmacêutica, que tem se consolidado como um dos pilares econômicos no Brasil. O setor movimenta bilhões de reais anualmente e gera milhares de empregos diretos e indiretos, sendo um motor para inovação e competitividade no país. A flexibilização das normas de publicidade pode, portanto, reverberar em maior dinamismo e novas oportunidades de expansão, especialmente em um mercado tão promissor quanto o brasileiro.

Para mais informações, entre em contato com o nosso time de Life Sciences, Healthcare e Cannabis.

Autores

  • Bruna B. Rocha, Sócia
  • Juliana Marcondes de Souza, Associada
  • Victoria Cristofaro Martins Leite, Associada
  • Camila Dulcine, Trainee

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