Mudança climática: para esquerda ou direita? 13 out 2022

Mudança climática: para esquerda ou direita?

A resposta à provocação do título deste artigo é simples: para toda e qualquer direção. Desde mais precisamente a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, realizada em 1972 na Suécia, a ONU vem liderando as discussões políticas a respeito dos efeitos das atividades antrópicas sobre o meio ambiente, com inegáveis consequências para o clima. A Declaração de Estocolmo, que contém a criação do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, tinha como foco de discussão a emissão atmosférica e a poluição de recursos naturais decorrentes do processo intenso de industrialização pela qual atravessa a humanidade à época. Inclusive, no Brasil, a Declaração de Estocolmo estimulou os debates em torno da criação da Política Nacional do Meio Ambiente, culminando com sua promulgação quase dez anos depois (Lei Federal nº 6.938/1981), bem como a inclusão de capítulo específico (Capítulo VI) dedicado ao meio ambiente na Constituição Federal promulgada em outubro de 1988.

Aliás, durante o amadurecimento dessa discussão, o Brasil teve relevante protagonismo com a realização da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, sediada no Rio de Janeiro, mais conhecida como ECO-92. Naquele momento, ainda que com algumas incertezas científicas sobre os impactos a longo prazo, a preocupação estava diretamente relacionada às concentrações atmosféricas de efeito estufa, intensificando-se o efeito estufa natural e, por consequência, o aumento das temperaturas no globo. Trata-se de documento universal que estimula a necessária e inevitável cooperação internacional, com vistas a estabelecer um nível de responsabilidade dos países, notadamente os chamados países desenvolvidos, quanto à adoção de política ambiental que visasse controlar os níveis de emissão atmosférica de gases de efeito estufa e que considerasse os fatores relacionados com a mudança do clima em suas políticas e medidas sociais, econômicas e ambientais pertinentes. Entretanto, tal documento peca pela ausência de metas específicas de redução do nível de emissões aos países signatários, mantendo-se a essência de declaração programática.

A omissão quanto às metas foi sanada nas declarações posteriores sobre o tema, notadamente o Protocolo de Quioto de 1997, dirigido originariamente aos países desenvolvidos, e o Acordo de Paris firmado em 2015, que passou a estabelecer o compromisso dos países signatários em manter o aumento da temperatura média global baixo de 2° C, considerando-se os níveis pré-industriais, e buscar esforços para limitar o aumento da temperatura a 1,5° C. Além de ser signatário dos acordos internacionais, durante o período que divide a edição dos citados documentos internacionais, o Brasil promulgou internamente importantes normas sobre o tema, com especial destaque para a Lei Federal nº 12.187/2009, que dispõe sobre a Política Nacional sobre Mudança do Clima, e o Novo Código Florestal (Lei Federal nº 12.651/2012). No caso da Política Nacional sobre Mudança do Clima, ficou estabelecido que são diretrizes do Brasil, dentre outras, o cumprimento dos acordos internacionais sobre mudança climática, o estímulo e apoio à participação de todos os níveis de governo e do setor produtivo no desenvolvimento e na execução de políticas, planos, programas e ações relacionadas à mudança do clima, bem como o apoio e fomento às atividades que efetivamente reduzam as emissões ou promovam as remoções por sumidouros de gases de efeito estufa.

Portanto, está claro que o desenvolvimento de projetos de energia renováveis, com especial destaque para as fontes solar e eólica, iniciativas associadas a hidrogênio verde, crédito de carbono, bem como o estímulo ao uso do biogás e a necessidade de redução do desmatamento ilegal são medidas que estão intimamente associadas a atos políticos do Estado brasileiro, e não de determinado governo ou partido político. A edição de uma norma jurídica pressupõe a atuação das funções de Estado que representam a vontade soberana da sociedade e, a partir de sua inserção no ordenamento jurídico, todo e qualquer governo deve acatá-la. A confiança dos investidores no ambiente político e na estabilidade de governança é também fator crucial para implementação exitosa de política que vise combater internamente os efeitos negativos sobre a mudança do clima, até mesmo porque ao Estado cabe a criação de oportunidades para que os agentes econômicos identifiquem oportunidades de ganhos e, ao mesmo tempo, demonstrem à sociedade e a seus shareholders seu compromisso com fatores de sustentabilidade.

Em tempos de campanha eleitoral, a pauta ambiental tem papel central nas discussões, sendo quase sempre tratada nos discursos com o mesmo dualismo que representa ser um governo de direita ou esquerda. Sem adentrar no campo eleitoral, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado pressupõe reconhecimento de direito subjetivo que se desdobra em obrigação do Poder Público e da própria sociedade. Dessa forma, independentemente da direção que o Brasil tome, direita ou esquerda, a contribuição nacionalmente determinada, apresentada pelo País por ocasião da COP-26 no ano passado, com o compromisso de reduzir a emissão de gases de efeito estufa até alcançar sua neutralidade em 2050 e de zerar o desmatamento ilegal até 2028, deverá ser perseguida com rigor e sob o olhar atento da sociedade.

 

Principal Contato:

Vilmar Gonçalves
Sócio
E: vilmar.goncalves@cmalaw.com

Comentários