Você sabia que o tema da litigância climática tem se tornado cada vez mais relevante no Brasil?
Já é absolutamente consolidada e historicamente conhecida a função punitiva ou reparatória das ações judiciais por danos ambientais no Brasil, isto é, aquelas demandas que buscam a responsabilização de pessoa física ou jurídica por ações ou omissões que gerem efeitos negativos sobre o meio ambiente.
Contudo, provocada pelo cenário de mudanças climáticas e seus efeitos sobre o meio ambiente e o modo de vida da humanidade, essa temática vem ganhando novos contornos nacional e internacionalmente, tanto no campo político quanto judicial, estando atualmente focada na tentativa de redirecionar os mecanismos de responsabilização à busca por reparação ou simplesmente para estimular o aumento de iniciativas que mitiguem, retardem ou, em um futuro não muito distante, eliminem os efeitos negativos da mudança do clima.
Para se referir a essas demandas judiciais, cunhou-se o termo “litigância climática”, que passa a abranger os processos que versam, em sua grande maioria, sobre questões relacionadas ao controle e redução das emissões de gases de efeito estufa, à tentativa de mitigação dos efeitos das mudanças climáticas, à responsabilização de atores que contribuem para a mudança climática e à tentativa de reparação de danos decorrentes das mudanças climáticas (assim chamados danos climáticos).
Pode ser considerado como litígio climático a demanda que, embora não possua a temática da mudança climática como ponto central, (i) possua a temática da mudança climática como ponto periférico, (ii) ou como motivação para a demanda, e (iii) resultam em mitigação ou adaptação relacionada ao tema:
A litigância climática está intimamente relacionada ao conceito de Justiça Climática, que visa, tal como a Justiça Ambiental, evitar que os impactos oriundos da mudança climática atinjam, de formas diversas, grupos sociais distintos.
Tal preocupação também decorre da percepção de que aqueles que mais são atingidos pelas consequências da mudança climática nem sempre são os que mais contribuem para as emissões de gases de efeito estufa: países do sul (mais vulneráveis aos efeitos das mudanças climáticas e com menor nível histórico de emissões dos gases de efeito estufa) e os países do norte (menos vulneráveis e com maior nível histórico de emissões).
Significa dizer que, no âmbito do conceito de Justiça Ambiental, há uma linha de estudo que defende que grupos sociais distintos têm responsabilidades diferenciadas, sendo a desigualdade social um definidor do grau de exposição dos grupos sociais aos riscos ambientais.
A Justiça Climática tem como proposta colocar em prática iniciativas e políticas que busquem tratar das dimensões éticas de direitos humanos das mudanças climáticas de forma a reduzir a vulnerabilidade de grupos sociais desproporcionalmente afetados pelas mudanças do clima (EBI, 2009, ROBERTS & PARKS, 2009, SHEPART & CORBIN-MARK, 2009: TYREE & GREENLEAF, 2009).
No Brasil, em um primeiro momento, a litigância climática pareceu restrita à tentativa de impor, principalmente ao governo federal, a implementação de medidas efetivas ou tendentes a garantir a implementação de compromissos internacionalmente assumidos (no ambiente de políticas públicas, de produção legislativa e de efetividade da legislação existente).
Precisamente, nos últimos três anos, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou ações que são representativas dos litígios climáticos contra o Poder Público, entre as quais destacamos:
Atualmente, em paralelo às cobranças direcionadas ao Poder Público, se identifica uma mudança no direcionamento dessas demandas judiciais, com foco cada vez maior na tentativa de responsabilizar atores que contribuem com a emissão de gases de efeito estufa, seja para que adotem medidas mais efetivas ao controle e redução das emissões de gases de efeito estufa, seja para que reparem danos climáticos já ocorridos.
O próprio Poder Judiciário já vem se preparando para essa mudança de paradigmas, tendo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editado a Resolução nº 433/2021, que institui a Política Nacional do Poder Judiciário para o Meio Ambiente, determinando que, na condenação por danos ambientais, o magistrado deverá considerar “o impacto desse dano na mudança climática global”. A mesma resolução ainda criou a classificação do subtema litigância climática (15008) para agrupar as ações que “ações que suscitam questões materiais a partir de normas ou de fatos relacionados à mitigação das mudanças climáticas, adaptação às mudanças climáticas ou à ciência das mudanças climáticas”. Mais recentemente, em 26 de setembro de 2023, foi aprovado pelo CNJ o Protocolo de Julgamento de Ações Ambientais que tem por objetivo efetivar a política nacional prevista na Resolução nº 433/2021, ampliar a atuação dos órgãos do sistema de Justiça para a proteção do meio ambiente e estimular o atendimento aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da ONU.
A última estatística disponibilizada pelo CNJ através do painel interativo SireneJud[4] indicava:
Importante destacar também as análises contidas no Global Climate Litigation Report do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente que, em seu relatório de 2020, indicava a existência de três ações contra o governo brasileiro, passando a reportar 30 ações que tratam de mudanças climáticas no Brasil no relatório de 2023 (com dados até 31/12/2022).
Para maiores informações, consulte nosso time de Ambiental.
Principal contato:
E: vilmar.goncalves@cmalaw.com
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[1] Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental.
[2] Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão.
[3] Ação Direta de Inconstitucionalidade
[4] Disponível em https://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/sirenejud/.
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